Li essa frase no museu Torres García em Montevideo, que alugou um triplex na minha cabeça, rsrs. Acontece que ao pesquisar sobre o sentido desse trecho, percebi que ela respondia a um questionamento que tenho. Trata-se da falta de pertencimento que eu, como brasileira, não tenho com a América latina. Para mim, o Brasil destoa dessa latinidade tão pulsante nos demais países do hemisfério sul.
Com isso, surgiram outras perguntas: A relação centro/periferia do modelo colonizador persiste na produção visual latino-americana? As tecnologias oferecem outras formas de representação que rompem com a cultura de repetição? Aprendemos a olhar para nós mesmos e rompemos com uma cultura de repetição? Podemos continuar falando em América Latina como uma unidade? Onde está a América Latina no contexto geopolítico-cultural do mundo globalizado?
Não responderei a tais perguntas, mas deixo o link do texto que aborda tais questões. Clique aqui para ler.
Porém, duas perguntas me chamam atenção: podemos continuar falando em América Latina como uma unidade? Onde está a América Latina no contexto geopolítico-cultural do mundo globalizado?
A frase “Nuestro Norte es el Sur” de Joaquín Torres García é uma declaração poderosa e emblemática que ressoa profundamente com a busca da América Latina por uma identidade cultural própria. Esta frase, simples em sua construção, tem profundidade de significado e simbolismo, destacando a importância de valorizar e reconhecer as raízes culturais e a história do continente.
A “Escuela del Sur” é uma proposta de Joaquín Torres García que sugere que a América Latina inverta sua posição de dependência cultural, valorizando seu legado e resgatando a arte indígena com sua geometria. A ideia é estabelecer um diálogo entre uma arte construtiva que harmonize com as leis universais e o saber de todos os tempos históricos, promovendo uma arte própria e autêntica para o continente, desvinculada da influência europeia.
A frase também tem implicações profundas para o movimento de descolonização cultural. Ao afirmar que “Nuestro Norte es el Sur”, Torres García está rejeitando a ideia de que as normas e padrões culturais devem ser importados de outras partes do mundo. Em vez disso, ele promove uma visão de independência cultural onde a América Latina pode definir suas próprias normas e valores, baseando-se em suas próprias tradições e inovação criativa.
Ao proclamar “Nuestro Norte es el Sur”, o autor desafia a tradicional perspectiva eurocêntrica que dominava a arte e a cultura durante o seu tempo. Historicamente, muitos países latino-americanos olhavam para a Europa e, mais tarde, para os Estados Unidos, como modelos de progresso, desenvolvimento e sofisticação cultural. Esse olhar constante para o “Norte” muitas vezes resultava na desvalorização das próprias culturas locais e indígenas, criando um complexo de inferioridade cultural.
Deste modo, Torres García motiva os latino-americanos a se voltarem para suas próprias terras, suas próprias histórias e tradições, e encontrem nelas a inspiração e a orientação para o desenvolvimento cultural e artístico. Ele sugere que a verdadeira riqueza cultural da América Latina reside em suas próprias experiências e expressões autênticas. Este chamado para “olhar para o Sul” é, portanto, um convite para uma reavaliação e revalorização do que é intrinsecamente latino-americano.
Além disso, “Nuestro Norte es el Sur” tem um eco político e social, propondo uma unidade e solidariedade entre os países latino-americanos. Ele sugere que, em vez de olhar para fora em busca de modelos, os países da região deveriam olhar uns para os outros, compartilhando experiências e conhecimentos, e construindo um futuro coletivo baseado em suas próprias realidades.
Portanto, trata-se não apenas de uma declaração artística, mas uma filosofia de vida e uma estratégia de resistência cultural. Ela inspira artistas, intelectuais e cidadãos a reconhecer e celebrar a identidade latino-americana em sua totalidade e complexidade. Ao internalizar essa mensagem, a América Latina pode se afirmar no cenário global não como uma mera imitadora das potências culturais do Norte, mas como uma fonte vibrante e original de cultura e criatividade.
Em conclusão, “Nuestro Norte es el Sur” é uma frase que encapsula a essência do movimento de autoafirmação cultural na América Latina. Ela nos lembra da importância de olhar para nossas próprias histórias e culturas como fontes de valor e inspiração, promovendo um sentido de identidade e orgulho que é essencial para o desenvolvimento cultural e social autêntico da região.
Segue mais uma sugestão de texto que explora mais essa temática: América invertida: o mapa de ponta cabeça